10/04/2011

A cegueira revelada na tragédia

Passado o choque inicial da tragédia na escola em Realengo, mas ainda doída pelas crianças, suas famílias e toda a comunidade que viveu de perto o massacre, fica a terrível sensação de impotência diante das possíveis conseqüências violentas dos transtornos mentais.

Em relação a este horrível episódio, fala-se muito sobre não considerá-lo dentro do espectro da segurança urbana ou ainda sobre a questão do desarmamento que inquestionavelmente está ai presente, mas pouco e superficialmente se discute o transtorno mental e sua implicação na família e na sociedade.

Avaliar a personalidade do atirador, compreender suas raízes e pilares (ou a falta deles), entrar no mundo particular da mente de um esquizofrênico (como vem diagnosticando a mídia) e refazer, passo a passo, seus objetivos e a trama que envolveu todo o planejamento e a execução de seu ato, traz enormes benefícios para a investigação policial e para o estudo mais apurado das nuances psicológicas dos seres humanos. No entanto, é preciso falar da massificada ignorância social a respeito dos transtornos mentais.

Irmão, colegas de escola, vizinhos e sobrinho do atirador conheciam e agora falam de seu comportamento anti-social, de seus interesses por armas de fogo e atentados terroristas e de suas idéias destrutivas. Descrevem o rapaz como uma pessoa de “hábitos estranhos”.

Não se julga nem se diagnostica ninguém pela diferença e idiossincrasia, mas parece-me que faltou a estas pessoas um pouco mais de informação e conhecimento para perceber que a estranheza do rapaz poderia estar atrelada a uma doença e, ainda mais, que esta poderia trazer prejuízos inestimáveis para ele e para a sociedade caso não fosse cuidada a tempo.

Desconfio que a desvalorização, o descuido e o ainda presente preconceito em relação aos transtornos mentais, assim como ao trabalho de psiquiatras e psicólogos, influem diretamente nesta cegueira social.

Não digo que as pessoas que o conheciam são responsáveis pela tragédia. Na verdade penso que estão inseridas num contexto que não possibilita a elas o acesso ao tema de uma forma simples, direta e esclarecedora. Além disso, mesmo que tivessem percebido que o problema era maior que estranheza, a quem elas recorreriam?

Órgãos públicos de saúde e de educação carecem de profissionais desta área e a sociedade perde de várias formas: por ter restritas possibilidades de repensar projetos sociais preventivos e paliativos; pela indisponibilidade de assistência especializada popular que atenda à demanda; pelo atraso nas pesquisas científicas e, conseqüentemente, na evolução dos tratamentos; pela não popularização da discussão e da compreensão dos transtornos mentais, o que facilitaria a identificação e a busca precoce pelo tratamento...

Dar espaço e valorização ao trabalho de psiquiatras, psicólogos e profissionais da saúde mental traria inúmeros benefícios à população em geral e não apenas àqueles que podem pagar por consultas e tratamentos hospitalares particulares. E, quem sabe, ajudaria a evitar inúmeros atentados como este que destruiu pessoas, não somente as que perderam a vida, mas também as que terão que se reconstruir para continuarem vivendo.

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