06/06/2010

Para além da decisão

Não há como fugir... Estou a 5 centímetros do final do trampolim, visada pelos meus pais e irmãos que esperam o grande momento em que poderei provar a todos que superei o medo e irei desfrutar de salto na piscina que fez parte de toda a minha infância. Olho para a piscina e sei que ela pode receber uma adolescente magrinha depois deste salto. Olho para meus expectadores e sei que eles sabem que posso pular sem me machucar. Mas quando olho para mim, vejo que o medo ainda existe. E não é da piscina, nem de afogamento. Talvez seja do pulo, da emoção, da superação... Não sei, mas incrivelmente depois de toda a adrenalina que antecede o salto, decido voltar, de costas, à base do trampolim. Centímetro a centímetro meus pés vão se movendo e equilibrando na busca da sensação de conforto e segurança. Agora posso voltar a respirar! O susto passou! Desço aliviada pela escada e encerro, neste momento, toda e qualquer tentativa semelhante pelo resto da vida.

Se pular de um trampolim depois de meses de treino pode ser uma decisão difícil, imagina o turbilhão que acontece dentro de uma pessoa quando se dá conta de que quer ou deve finalizar uma relação longa na qual o amor e o respeito acabaram faz tempo? É o mesmo mal estar que alguns sentem ao decidir sair de um emprego bem remunerado e buscar outro que proporcione o encontro com a satisfação e o prazer. Muitos outros exemplos de decisões podem ser dados e variam conforme o grau de importância que têm para cada pessoa: viajar para outro país em busca da liberdade e da identidade que em casa foram negadas, assumir para si e para os outros a escolha sexual, libertando-se das farsas e mentiras que tanto incomodavam etc.

Decidir não é fácil, pois envolve perda, abrir mão de uma situação já conhecida e confortável, medo do arrependimento e insegurança quanto ao futuro. Além do mais para decidir é preciso ter uma dose de audácia e coragem diante do desconhecido, exigindo muita disposição para o recomeço.

Mesmo depois de uma decisão ter sido tomada, há uma distância significativa que a separa de sua efetivação. Quantos já se viram paralisados diante dos 5 minutos que antecedem a concretização de uma decisão que, aparentemente, reflete o que mais deseja ou precisa? Mais complicado ainda é para aqueles que vêem a paralisia repetir-se a cada tentativa de dar o primeiro passo. De forma crônica e apavorante, esta pessoa percebe-se presa a uma situação desconfortável e não consegue mobilizar energia suficiente para reverter o quadro.

Nestes casos é necessário investigar o que está impedindo a materialização de uma decisão (sentimentos, engessamentos, fantasias), assim como reavaliar a própria decisão: o que ela representa na vida da pessoa, quais influências ela sofre, em que situação ela foi tomada, ela responde ao desejo e à necessidade de quem etc. Lançar um olhar profundo sobre a decisão e o processo que acontece ao redor dela ajudará no esclarecimento de muitas questões que estão ocultas, proporcionando o autoconhecimento que levará a pessoa a apropriar-se dos seus mais autênticos desejos e escolhas.